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A Doutrina do Pecado de Morte como fator de desenvolvimento de quadro depressivo nos membros na Congregação Cristã no Brasil (1ª parte)

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Mensagem  marcio ferreira Ter Jan 01, 2013 7:17 pm



A DOUTRINA DO PECADO DE MORTE COMO FATOR DE DESENVOLVIMENTO DE QUADRO DEPRESSIVO NOS MEMBROS DA CONGREGAÇÃO CRISTÃ NO BRASIL

Evandro Rodrigues (IC) e Antônio Máspoli de Araújo Gomes (Orientador)
Apoio: PIVIC Mackenzie


Resumo

Esta pesquisa tem como finalidade analisar o grave problema moderno relacionado à depressão, com
foco no sentimento religioso dos membros da Congregação Cristã no Brasil. Historicamente, as
denominadas doenças do cérebro estiveram relacionadas a fatores espirituais, como o castigo por
causa do pecado ou transgressão aos mandamentos divinos. Embora possua seu caráter terapêutico,
o sentimento religioso vem sendo considerado como fator impeditivo para que os cristãos portadores
de doenças mentais procurem tratamento terapêutico profissional. Dentro da teologia evangélica,
determinados pecados, principalmente os de ordem sexual, são considerados como erros graves,
passíveis de punição e castigo divino. O cristão, de maneira geral, vê-se em constante estado de
tensão entre os desejos instintivos de seu corpo e os preceitos que regulam sua fé. Como agravante,
a Congregação Cristã no Brasil tem defendido, ao longo de sua história, que os pecados de ordem
sexual são delitos irreversíveis, considerados como “pecado de morte”. O membro desta
denominação vive maior tensão, pois, caso cometa algum pecado dessa natureza, perde a condição
de filho de Deus e de membro da igreja. Nesta condição, para o indivíduo que comete tal
transgressão não resta mais esperanças, pois sua condição de pecador o coloca frontalmente em
oposição a Deus, sem qualquer perspectiva de restabelecimento espiritual frente ao grupo. Assim, a
pesquisa procura compreender as causas que levaram a Congregação Cristã no Brasil a adotar o que
chama de “doutrina do pecado de morte” e sua relação inequívoca com os pecados de ordem sexual,
bem como entender em que níveis essa doutrina pode influenciar os fatores que desencadeiam os
quadros depressivos em seus membros.

Palavras-chave: Congregação Cristã no Brasil, depressão, pecado de morte

Abstract

The goal of this research is to analyze the serious modern problem related to depression, focusing on
the religious feelings of the members of the Christian Congregation of Brazil. Historically, the so-called
diseases of the brain were related to spiritual factors, as the punishment for sin or transgression of
divine commandments. Although it has its therapeutic character, the religious feeling has been
considered as impediment to Christians with mental diseases to look for professional therapeutic
treatment. Within the evangelical theology, certain sins, especially of sexual order, are considered as
serious mistakes, liable to divine punishment and penalty. The general Christian, finds himself in a
constant state of tension between instinctive desires of his body and the precepts that govern his faith.
To make matters worse, the Christian Congregation of Brazil has advocated throughout its history,
that the sins of sexual order are irreversible, considered as "death sin". Members of this denomination
live in great tension, because if you commit such a sin, you lose your 'Child of God' condition and
church member status. In this condition, for the individual who commits such an sin, there is no longer
hope, for his sinful condition puts him directly in opposition to God, without any prospect of spiritual
revival in the group. The research seeks to understand the causes that led the Christian Congregation
in Brazil to adopt what they call the "doctrine of death sin" and its unequivocal relation with the sins of VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
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sexual order, as well as to understand to which levels this doctrine can influence the factors that lead
their members to a depressive state.
Key-words: Christian Congregation of Brazil, depression, death sinUniversidade Presbiteriana Mackenzie
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Introdução

A depressão tem sido considerada como o “mal do século”. Diante das dificuldades da vida,
muitas pessoas vêem-se incapazes de enfrentar os problemas de forma equilibrada,
buscando soluções racionais e efetivas para cada desafio que a vida apresenta. A perda de
um ente querido, o fracasso profissional em um mundo tão competitivo, as dificuldades em
lidar com os filhos ou com os pais idosos, desilusões amorosas e tantos outros problemas
acabam por minar as energias do indivíduo. Assim, em muitos casos, as pessoas preferem
atribuir suas dificuldades e fracassos a entidades ou forças que povoam outro plano, o
mundo espiritual, ao invés de optarem pelo enfrentamento e resolução. Desde muito cedo a
humanidade tem feito uma relação direta e inequívoca entre os problemas e a atuação de
forças espirituais, seja na forma de ingerência maligna dos demônios, seja como respostas
punitivas das divindades a ações consideradas como pecados. Na moralidade cristã existem
categorias de pecados bastante definidas. Esses pecados, se cometidos, são passíveis de
severa punição divina, já que Deus, embora misericordioso e compassivo, também é
apresentado como o Grande Juiz. Dentre essas categorias, nenhuma é mais temida do que
os pecados de natureza sexual. Manter relações sexuais fora do padrão estabelecido pela
Bíblia fatalmente representará um grande agravo. Desta forma, o temor por parte daqueles
que não cometeram esse tipo de pecado ou a tristeza por parte daqueles que o cometeram
pode desencadear um angustiante processo de autopunição. Acrescentando-se as sanções
eclesiásticas e a reprovação do grupo em que o indivíduo encontra-se envolvido, obtêm-se
propícia condição para o desenvolvimento de doenças de ordem depressiva.
A Congregação Cristã no Brasil é uma denominação considerada protestante. Porém, desde
a sua origem, mantém particularidades em sua doutrina que a diferencia das demais igrejas
protestantes. Dentre essas particularidades está a doutrina relacionada aos pecados de
natureza sexual. O membro desta denominação tem consciência de que, caso cometa esse
tipo de pecado, é impossível ter sua condição restaurada diante de Deus e do grupo, pois a
Congregação Cristã no Brasil relaciona os pecados sexuais com o “pecado de morte”. Uma
vez cometido o pecado de morte, mesmo que haja arrependimento por parte do pecador,
este está excluído da comunhão com os irmãos e com Deus. Resta-lhe apenas o juízo final.
A presente pesquisa procura investigar se a doutrina do pecado de morte, da maneira como
é concebida pela Congregação Cristã no Brasil, constitui fator de desenvolvimento da
depressão e elemento agravante dos quadros depressivos entre os membros da
denominação. Os objetivos visam identificar a influência da doutrina entre os membros, bem
como compreender o desenvolvimento dessa doutrina e avaliar até que ponto sua
assimilação dificulta o diagnóstico e o tratamento do portador de depressão. VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
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Referencial teórico

A busca pela compreensão da relação entre depressão e o sentimento religioso carece ser
iniciada a partir de uma análise da cosmovisão do assim denominado “homem primitivo”. O
ser humano, desprovido do aparato científico para auxiliá-lo a explicar a realidade a sua
volta, atribuía a seres superiores – deuses e demônios – a causa dos fenômenos que o
assombravam, como as doenças e as catástrofes naturais. Nesse sistema de compreensão
de mundo, tudo aquilo que causava medo e sentimento de impotência estava relacionado
diretamente a alguma ação humana que, de alguma maneira, desagradava os deuses ou
incitava os demônios, levando-os a agir, cheios de cólera, de forma punitiva, afligindo os
homens. Como esclarece Émile Durkheim: “Com frequência se atribuíam as primeiras
concepções religiosas a um sentimento de fraqueza e dependência, de temor e de angústia
que teria se apoderado do homem ao entrar em contato com o mundo” (1966, p. 231). Neste
sentido, foram desenvolvidas ações visando aplacar a ira dos deuses ou repelir os
demônios. Essas ações são denominadas “rituais”. Continua Durkheim: “Vítima de uma
espécie de pesadelo criado por ele próprio, o homem teria se acreditado cercado de forças
hostis e temíveis que caberia aos ritos apaziguar” (1966, p. 231).

A princípio, a religião seria definidamente politeísta. O homem relacionava cada evento a
uma divindade. Assim, em épocas de seca, havia uma divindade específica a ser invocada
para que houvesse chuva. Em tempos de guerra, outra divindade era chamada para auxiliar
o exército na peleja. Posteriormente, os hebreus inauguraram uma nova fase da religião,
passando a eleger uma divindade única a ser cultuada entre o imenso panteão dos povos
cananeus e povos circunvizinhos. Dentro dessa nova visão de mundo permaneceu a
intrínseca relação entre as catástrofes e o castigo divino, com a distinção de que, agora, as
calamidades não eram causadas por espíritos, demônios ou múltiplas divindades, mas por
uma única divindade, a saber, YHWH, o Deus hebreu:

Qualquer calamidade ou sofrimento era percebida pelos hebreus como um castigo
de Iavé ou Jeová. Os Hebreus não raro se afastavam de Iavé, e se aproximavam de
outros deuses como os Ba´als. Iavé então os punia com catástrofes, sofrimentos e
doenças, para que retornassem ao caminho correto, afirmando sua fé no único e
verdadeiro Deus (DEUS, 2010, p. 26).

O que o sentimento religioso primitivo captava sob a forma de ‘terror demoníaco’ e
que mais tarde se desenvolve, cresce e se enobrece, não é a origem ou é ainda algo
de racional ou de moral, mas algo específico e precisamente irracional. [...] O próprio
terror demoníaco que tem múltiplos graus eleva-se ao nível do temor dos deuses e
do temor de Deus. O daimonion torna-se theion (OTTO, 2005, p. 145).

Considerando a religião sob o ponto de vista de sua evolução, do totemismo ao monoteísmo
é possível perceber que culpa, pecado, doença e angústia aparecem repetidamente em uma
dualidade relacional, ligados ao castigo divino. Porém, nos ensinamentos de Jesus Cristo é
possível identificar uma tentativa de dissociação entre doenças e castigo. Analisando o Universidade Presbiteriana Mackenzie
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episódio narrado em João 9.1-3, onde os discípulos de Jesus discutem a respeito das
causas da cegueira de um homem, Pérsio Gomes de Deus (2010) afirma:
Vê-se nesta passagem, que os discípulos de Jesus mantinham a compreensão
judaica de que a doença é um castigo enviado por Jeová devido a um pecado. Jesus
oferece um precioso ensinamento quando desvincula a doença da conseqüência do
pecado (p. 34).

Os judeus contemporâneos a Jesus e, posteriormente, os cristãos, não incorporaram essa
abordagem de Jesus com relação a doenças e castigo, mas permaneceram na repetição da
cosmovisão religiosa cristalizada ao longo dos anos. Jesus fez clara distinção entre doentes
físicos, doentes mentais (lunáticos) e possessos. Porém, o cristianismo desenvolveu-se sob
o mesmo paradigma judaico, onde as enfermidades estariam relacionadas aos pecados
cometidos, a idolatria ou a alguma relação com o diabo ou com as “forças das trevas”.
Conforme assevera Jean Delumeau (2003, p. 574):

É preciso lembrar que Jesus, por três vezes, levantou-se contra a associação
explicativa entre pecados e desgraças: a propósito do cego de nascença (Jo 9,1-4),
das vítimas da torre de Siloé e dos galileus massacrados por Pilatos (Lc 13,2-6).
Mas essa lição tão moderna do Senhor durante muito tempo foi esquecida.
Desde os seus primórdios, a igreja cristã incorporou a dualidade da filosofia grega, onde
tudo o que é relacionado à matéria é ruim, ao passo que as coisas concernentes ao “mundo
espiritual” (mundo das idéias, no platonismo) são boas e puras. Dessa maneira, o cristão
vive a ambiguidade de dois mundos, angustiando-se nessa constante tensão. Seus desejos
e inclinações passam a concorrer diretamente com as exigências de sua fé.

Precisamente na questão sexual o dilema é notado em sua forma mais aguda. As escrituras
judaicas não permitem uma interpretação de que a sexualidade é algo ruim, pecaminoso. O
livro Cântico dos Cânticos, por exemplo, retrata em forma de poema a beleza da união entre
um homem e uma mulher. Porém, mesmo considerando as escrituras judaicas do Antigo
Testamento como inspiradas por Deus, os cristãos, em sua teologia, passam a fazer uma
leitura alegorizante dessas passagens, interpretando o homem como Jesus Cristo e a
mulher, ou noiva, como a igreja.

É igualmente estranha à Bíblia a noção de uma queda no sensível e no múltiplo. Por
outro lado, esses dois temas provêm do platonismo e de sua posteridade.
Mesclados com o Cristianismo, eles levaram à duradoura nostalgia de um primitivo
homem-anjo sem sexualidade, “espiritualizado”, dedicado à pura contemplação.
Daí o sucesso persistente da idéia, já presente em Santo Agostinho e amplamente
aceita no século 12, de que o homem foi criado para substituir os anjos caídos na
cidade celeste (DELUMEAU, 2003, p. 20, grifo nosso).

Ao tratar da sexualidade humana, católicos e protestantes valem-se da tradição
neoplatônica agostiniana, que vê no sexo função meramente reprodutiva. Aquilo que é
erótico e prazeroso não pode ser considerado como dádiva divina, mas como expressão
terrena, carnal, que deve ser reprimida. Conforme esclarece Rubem Alves (2005, p. 214):
Combinam-se, assim, na moral sexual, duas determinações. A primeira delas exige
que o sexo se desvincule do erótico. A segunda exige que a função sexual se
subordine à intenção consciente da procriação. O que é importante enfatizar é que a VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
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doutrina da sexualidade pressupõe uma antropologia. E Agostinho, neste caso
específico, é a influência determinante tanto da antropologia católica quanto da
antropologia protestante. Mas por detrás de Agostinho encontra-se o pensamento
grego acerca do homem, que divinizava as funções intelectuais da alma em
detrimento dos impulsos vitais do corpo.

Desta forma, a relação sexual só é permitida dentro de uma regra, cumprindo-se a exigência
doutrinária para receber a concessão: o casamento civil. Qualquer relação sexual fora do
casamento é considerada pecado, passível de sanções.
Continua a dizer Rubem Alves (2005, p. 209):

A moralidade sexual protestante é regida por um princípio extremamente simples e
que não permite ambigüidades: O sexo é permitido se, e somente se, ocorrer dentro
do casamento. Atos de natureza sexual e relações sexuais antes do casamento ou
que, após o casamento, transgridem os seus limites, são terminantemente proibidos.
São pecados que devem ser punidos.

Em todo desenvolvimento da fé cristã percebe-se claramente a dicotomia entre alma e
corpo, mundo material e mundo espiritual. O corpo do cristão não pode ser um fim em si
mesmo, mas apenas um instrumento para que dele Deus se utilize para seus propósitos.
Portanto, atender as inclinações do carne, aos instintos do corpo é uma decisão que entra
por uma via diametralmente oposta à vontade de Deus. E, contrariar a vontade de Deus,
significa viver em oposição a ele, sujeito as penalidades e aos castigos que ele impõe ao
impenitente. Diz a carta aos Hebreus 10.31: “Horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo”.
Cabe então ao cristão reprimir as exigências de seu instinto humano, para satisfazer o que
acredita ser a vontade de Deus.

Nesta lógica, a sexualidade parece ser a manifestação última dos desejos que afastam o
cristão de seu Deus. Vê-se na doutrina católica um ponto alto da dicotomia entre corpo e
alma: o celibato. Ser um ministro do Senhor autorizado a manipular os elementos
sacramentais e, ao mesmo tempo, atender aos instintos sexuais são ações completamente
excludentes. Para que o cristão católico seja um sacerdote de Cristo, é necessário fazer
uma escolha radical. Precisa abrir mão de suas inclinações e desejos, principalmente os de
ordem sexual e entregar sua vida integralmente ao serviço da igreja. Para o cristão
protestante, o celibato não é uma exigência. Porém, a visão sobre a sexualidade humana
não é diferente. O sexo não pode ser visto como benção, destinado ao prazer, mas como
um mero instrumento de reprodução que atende a uma exigência das escrituras: “crescer e
multiplicar”. Ao líder protestante é concedido o direito de manter uma vida sexual ativa,
porém, dentro dos padrões estabelecidos. Qualquer conduta sexual fora da norma desabilita
o ministro protestante a desenvolver seu trabalho. Esse padrão estende-se a todos os
demais. Qualquer relação sexual mantida por um casal antes do casamento (fornicação) ou
fora dele (adultério) é considerada um pecado grave, digno das sanções eclesiásticas mais
rígidas. Independentemente da confissão denominacional, este padrão mostra-se invariável. Universidade Presbiteriana Mackenzie
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Os corpos diretivos das denominações funcionam como uma espécie de tribunal que precisa
julgar os casos de pecado entre os membros. Para tanto, é necessário estabelecer
claramente quais são as condutas passíveis de pena. Para todo protestante é clara a noção
de que o homem é pecador por natureza, sendo todas as suas inclinações más diante de
Deus. Porém, determinados tipos de pecados – que podem ser classificados como de “foro
íntimo” – como a mentira, a fofoca e a avareza devem ser apenas confessados a Deus, com
arrependimento e desejo de que Deus auxilie o crente a mudar de atitude. Já os pecados
que se tornam públicos, como a fornicação, o adultério e os vícios precisam ser julgados
pela liderança da denominação. Assim, dentro da estrutura de pensamento protestante, os
pecados que devem ser julgados estão claramente definidos, não pela constituição ou pela
confissão da denominação, mas por um código de conduta que todos conhecem:
Onde estão, formalmente definidos, os pecados passíveis de punição? Em nenhum
lugar. Nesse caso as definições constituem uma série de acordos silenciosos que
todos conhecem, sem necessidade de codificação. A prática disciplinar revela uma
persistente regularidade no que se refere aos pecados que são punidos, de tal sorte
que é possível organizá-los em cinco classes distintas. A primeira classe é composta
de pecados do sexo (ALVES, 2005, p. 208).
Quando o indivíduo submete-se ao processo denominado “conversão” dentro da fé cristã,
passa a ter sua visão com relação à vida, ao mundo e ao seu próprio corpo profundamente
alterada. Este precisa passar por uma adequação radical de comportamento e linguagem.
Engaja-se então na batalha entre corpo e espírito, entre as coisas espirituais e as coisas
materiais, que são opostas entre si. Precisa desprezar linguagem e conhecimento próprios,
assumindo uma nova racionalidade, com uma filosofia subjacente – no caso, o platonismo
agostiniano. Seus desejos e vontades precisam ser reprimidos, amoldados a nova confissão
assumida. Seu comportamento precisa ser alinhado aos parâmetros da estrutura da qual
passa fazer parte para que não lhe sobrevenha as sansões eclesiásticas, a reprovação do
grupo e os castigos divinos. Para o autor Rubem Alves (2005) essa adequação do corpo a
essa nova racionalidade constitui inevitável fator de desenvolvimento de neuroses:
Na moralidade sexual e na ética do corpo, encontramos, a meu ver, a forma
concreta daquilo que já indicamos quando discutimos a teoria protestante do
conhecimento: o protestantismo substitui a vida pela linguagem, o corpo pela
palavra, a experiência por um dizer que a ignora. E se a essência da neurose é a
repressão do corpo por uma racionalidade que lhe é estranha, temos de chegar à
conclusão de que a ética protestante tende, inevitavelmente, a produzir neurose.
Mas o protestantismo é apenas uma espécie de um grande gênero que inclui o
catolicismo (p. 220).

As doenças mentais foram tratadas, ao longo da história e na maioria dos casos,
relacionadas à possessão demoníaca ou ao castigo divino. Ficar “louco” sempre foi visto
como resultado punitivo sobre aqueles que questionam a estrutura religiosa ou contra ela se
levantam. “O conceito de doença mental é recente, tem cerca de trezentos anos. O homem
primitivo considerava a doença mental como manifestações do sagrado em sua forma mais
negativa” (GOMES, 2010, p. 138). Forjado nesta estrutura que trata os instintos sexuais e VII Jornada de I

marcio ferreira

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Data de inscrição : 15/05/2011

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